Diante
de um pedido de ajuda, é imprescindível prestar atenção. Olhar para além da
vontade de ajudar. Enxergar aquele que roga por auxílio, compreendendo o
sentido do pedido.
Em
momentos de furacão a bondade aflora, e isso é lindo.
Entretanto,
havendo divergência entre o que o outro pede e o que se pretende fazer, é
imperioso questionar. Por que ele necessita daquilo? Qual a razão de recusar os
termos da oferta? Como a solução fácil o afetaria negativamente?
Em
situações de impotência, a linha que separa a boa intenção e a arrogância é
tênue.
Ajudar
segundo o próprio entendimento, desconsiderando a lucidez do outro, é colocar o
ego, a ilusão de heroísmo e a prepotência à frente do necessitado. É mostrar-se
superior ao sofredor, na indecência de definir o que ele precisa.
Insensato
é invalidar o que o outro sente, apenas porque é mais cômodo auxiliar de certo
modo.
Cruel
é atravessar os olhos daquele que se ajoelha e implora, explicando
exaustivamente, e ignorar o que ele diz.
Impiedoso
é partir do pressuposto de que ter uma doença, uma incapacidade física, um
desafio perene ou temporário, é sentença para interdição. Deve-se deixar o
laudo para os profissionais e, diga-se de passagem, não é aconselhável crer em
todos.
Sempre
vale uma quinta opinião.
A
dor machuca, traz destempero, muda a rotina, mas não mata o ser pensante no
corpo que padece. Se não quis o destino trazer o atestado de óbito, há que se
considerar o pedido e o pedinte.
Quantas
vezes a mão estendida, na realidade, só faz retirar o pouco que resta do
moribundo?
Se
ele quer limpar a própria ferida, deixemos. É um alento conseguir cuidar de si
mesmo até a idade em que as mãos e a cabeça não aguentem mais.
Se
ele não quer a louça lavada, respeitemos. O prato não vai apodrecer em um dia,
e a pia suja dá a esperança de que amanhã ele se levantará da cama.
Se
ele explica que o caos é temporário e contornável, dizendo que fará o possível
assim que a poeira baixar, concedamos um voto de confiança.
Esperemos
um pouquinho mais. Pensemos antes de agir pelo outro. A luta é dele.
Nosso
desafio é apoiar na retaguarda, isso é que é belo.
A
ferida que se tapa com esparadrapo pode ser aquela que ensina como respirar. A
pia que se deixa brilhante pode ser o atestado da perda de controle. O pó que
se retira com o pano pode ser aquele que falta para a fênix ressurgir das
cinzas. A roupa que se joga na máquina pode ser a última que aquece a alma
dilacerada. A conversa que se despreza pode ser a demonstração do mais alto
nível de autoconhecimento daquele que enfrenta a turbulência.
Acreditar
que fazer o que convém significa ajudar é sinal de incompreensão.
Porém,
sejamos justos.
A
frieza disfarçada de bondade e a arrogância de quem dita regras para o
padecimento alheio podem se transformar num grande remédio. O antídoto para o
delírio de que não se sofre sozinho. O colírio para vislumbrar que estar ao
lado não significa estar junto. O multivitamínico que dá energia para deixar a
bagagem da dependência emocional e seguir em frente.
Eis
que a alta inesperada faz o altruísmo aparecer e correr atrás, jogando a
máscara no chão. "Puxa, ele precisava de água, e eu insistindo em oferecer
o feijão! Estava disponível na prateleira..."
Assim
é: damos o que não nos tira o conforto e nos custa menos.
Acontece
que água dá em poço, meus caros. Quando está difícil obter um copo ou a
torneira fecha, o universo traz forças para cavar ou enfrentar os espinhos dos
cactos, diante ou distante da fonte que secou. Por vezes, gotas caem do céu e
encontram a cuia feita com as próprias mãos. Onde há vida, há condição na
solidão.
Perante
a súplica, o clamor e a reclamação, é de suma importância deixar os olhos e o
coração abertos.
Fazer
o bem sem olhar a quem? Sim.
Fazer
o bem, olhando profundamente para quem? Também.
24 de junho de 2018
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