sábado, 6 de dezembro de 2014

Feliz vida!

     Que calendário oficial que nada, o presente de Natal chegou mais cedo e um novo ano começa agora! Férias de verdade, tempo de comemorar os exames limpos e celebrar a vida com saúde!
Um desafio escrever sobre 2014, mas agora só consigo dizer que os ensinamentos e as bênçãos foram grandes. Meu agradecimento especial ao Luiz Fernando, pai e marido dedicado, homem maravilhoso, que no meio da aventura foi agraciado com um milagre.
     E os meus tesouros, tão pequeninos, que receberam a missão de amadurecer em aspectos que eu posso até ter vivenciado na idade deles, mas nem em sonho percebia que existiam... Os três foram a razão do meu levantar e aguentaram meus recorrentes destemperos com os sorrisos, as lágrimas, os abraços, as birras, as gracinhas, as brigas, os beijos e as atividades do dia a dia. Como resumir tudo isso? Eles têm uma mãe louca e brava, que grita e erra, mas que reconhece a dádiva de cada gesto que Deus lhe permite ter ao lado deles. Eu espero que, mesmo nesses caminhos tortos, fique evidente a minha eterna gratidão por terem me escolhido.

Feliz vida!
— se sentindo abençoada.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Insônia

O convite
na cama feita
entre o silêncio
do travesseiro
e a doce festa
com piscadela
do olho aberto
no despertar
da mente inquieta.
Sono, 
uma ilusão.



domingo, 31 de agosto de 2014

Meus textos publicados no especial "Nossas Letras", do Jornal Comércio da Franca

   Dentre as boas novas de 2014, tenho a satisfação de ver meus textos no especial Nossas Letras, do Comércio da Franca. Agradeço a oportunidade de publicar nesse jornal, que faz parte da trajetória de minha família.
       Faço um apanhado dos publicados até aqui:
   
   
Medo pra quê?
(05/04/2014)
http://gcn.net.br/noticia/246547/nossas-letras/2014/04/medo-pra-que

As vidas de Amadeu
(10/05/2014)
http://gcn.net.br/noticia/250186/nossas-letras/2014/05/as-vidas-de-amadeu

A revolta da cola universal
(17/05/2014)
http://gcn.net.br/noticia/250939/nossas-letras/2014/05/a-revolta-da-cola-universal

A melhor viagem
(24/05/2014)
http://gcn.net.br/noticia/251761/nossas-letras/2014/05/a-melhor-viagem

Francanês
(31/05/2014)
http://gcn.net.br/noticia/252557/nossas-letras/2014/05/francanes

As mortes de Zebedeu
(14/06/2014)
http://gcn.net.br/noticia/253961/nossas-letras/2014/06/as-mortes-de-zebedeu

Santa Ladainha! (a brabeza de um sujeito invocado)
(23/08/2014)
http://gcn.net.br/noticia/261639/nossas-letras/2014/08/santa-ladainha-a-brabeza-de-um-sujeito-invocado




quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Um sonho

Eu criaria uma regra básica:


  "Aqueles que, qualquer que seja o motivo ou a origem do vínculo, forem responsáveis por cuidar de menores incapazes, serão agraciados com uma saúde de ferro, pelo menos enquanto perdurar a obrigação. Finda esta, fica o desobrigado completamente disponível para os infortúnios da vida."

Sonhar não custa nada. Mas mesmo que fosse possível, de nada serviria, já que a tônica do mundo é fazer leis para não serem cumpridas. 

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Diploma entregue (novos rumos)


Resumo da ópera:
Processo de escolha adequado, novo lugar, momento mais tranquilo, nenhum questionamento - qualquer justificativa além do "eu sou grande e já posso estudar como meus irmãos" é desnecessária.
O menino entra feliz na sala, sem ao menos olhar para trás, e sai radiante horas depois. Adaptação imediata, mas no coração da leoa ainda resiste, embora fraquinha, aquela lenga-lenga apegada. 
No dia seguinte, um pai e uma mãe relatam sua saga. Eles estão radiantes por ver, na entrada de seu pequeno na escola, uma grande vitória na luta incansável e sofrida pela vida. Significa que ele tem saúde, é livre para ter contato com o mundo, fazer amizades, apreciar as árvores.
Clique para os 99,9% de pontos positivos. *Seu filho é saudável. Houve a bênção de retomar os planos e corrigir os equívocos que a urgência maquiava. Você agora pode acompanhar, levar e buscar*. Felicidade.
Uma semana depois, a vida apresenta mais duas guerreiras. Com humildade, mãe e filha enfrentam dificuldades e fazem sacrifícios, na fé e na esperança de que, um dia, a menina possa caminhar e aprender na escola. *Como o seu filho consegue*. Gratidão.
E foi assim que, em menos de de dez dias, quatro anjinhos ensinaram a uma adulta sobre as coisas singelas da vida: a fofura que estimulou a revisão do apego, o vencedor que desembrulhou sua medalha, a lutadora que mostrou o tamanho de sua graça, e ele - o caçula que soltou sua mão confiante, indicando que a mudança de rumo é, sim, comemorável. 
Exagero? Excesso de zelo? Falta de senso frente a problemas maiores? De forma alguma. Era o seu dilema, o seu desafio, a prova para a próxima etapa. Diploma entregue. Liberdade coletiva. Cada um seguindo seu rumo, juntos e separados. 
Claro que o fato de no final do segundo dia de aula a mamãe ter sido ignorada para o papai receber aquele abraço apertado, a gente abafa. Ah, é agosto, está explicado.

terça-feira, 29 de julho de 2014

Mudança de ramo (e de rumos)

   Ontem no parquinho uma fofura me perguntou se eu estava de férias. Demorei um pouco para processar a pergunta (de praxe atualmente). Entendi o motivo, e respondi que não, explicando que meu trabalho é como o das babás: eu cuido de crianças. 
   E a doçura do questionamento me fez tentar entender por que, mesmo depois de oito anos sem férias e uma breve licença não programada, além da necessidade patente, que por si só justificaria uma transformação despreocupada da rotina, ainda fico reticente. 
   Parece que estou perdida (em todos os sentidos) na luta contra a realidade moderna: academias para crianças improvisadas em locais para adultos, ou até especializadas, mas com uma aceleração constante; instituições que desconsideram o papel dos pais na vida do filho (até porque muitos não querem ter amolação mesmo), antecipam a alfabetização por não saber o que fazer com quem inicia a vida escolar tão cedo, ou não assumem o contratado; o desencontro entre as jornadas, o que demanda uma agenda exigente para os pequeninos, etc e tal.
   Definitivamente, minha cabeça é fora desse mundo. Até para aquelas que se intitulam alternativas na maternidade, apropriando-se de termos e sentimentos que todas têm, acho que meu apego é demais.
   Enfim, muito angustiante mudar de ramo. Mas com fé e aceitação, a gente consegue.

(23 de julho de 2014)

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Manchete de jornal

Quem disse que apenas o famoso
vira manchete de jornal?
Para cair na boca do povo
basta ser temperamental.

Notícia ruim corre bem rápido,
traz o comportamento curioso;
apoio condicionado e frágil
que não resiste ao furioso.

Pouco importa que se esclareça
que o incômodo é pontual,
não há comoção que dure
para o segundo temporal.

Diante da inércia relatada,
procuram nos classificados:
viagem para flashes e aplausos,
que importa o corpo esticado?

Alegria, o moribundo resistiu!
Esquecem os próprios dilemas -
é hora da mesa redonda,
discutir a origem do problema.

Seria o gene, o ar, a água, a comida?
De certo não, fatalidade é para os seus.
Pelas escolhas que fez na vida,
só pode ser o castigo de Deus.

Julgamento sem contestação,
pena de pronto aplicada;
melhor ficar com a única versão
daquela testemunha ilibada.

E seguimos na mesma pauta
condenando quem está doente,
doce ilusão é o que não falta
na tribuna do descontente.

Da redação:

Por mais que se reportem
às mensagens dos jornais,
a outra vida segue plena,
trincada em linhas verticais.

Notinhas pequenas à parte,
é a recente sinopse que diz:
enquanto perdura o debate,
o preso vai liberto e feliz.

domingo, 22 de junho de 2014

Uma graça alcançada - o milagre das células tronco


   Sabe quando o choque da graça alcançada é tão grande, tão grande, que você custa a processar para dar a notícia?

   Muitos sabem que, há exatos dois anos, retornávamos de uma estadia de 45 dias em Barcelona, na esperança de que a pesquisa com células tronco pelo menos aliviasse as fortes dores decorrentes de uma discopatia degenerativa, sem qualquer tratamento paliativo ou cirurgia aplicáveis no Brasil. 
   De uma nota na internet, foram vários e-mails e telefonemas num portunhol suado, até que o caso foi aprovado. E nós viemos com as crianças, as malas e a coragem, sem saber se era a luz da oportunidade divina, ou simplesmente uma loucura de quem não enxergava nada além do caos no desespero. 
  Na nossa aventura em família, experimentamos um turismo diferenciado, de quem não cruzou o oceano para passear. As belezas que conhecemos nessa maravilhosa cidade foram os bônus que vieram com a tempestade.
   Caíram muitas lágrimas ao preencher o primeiro questionário de acompanhamento, três meses após a inoculação das células nos discos vertebrais: nada de trégua do desconforto. Questionamos, em nossa fraqueza, se todo aquele esforço não teria sido em vão. 
   Sessenta dias depois, já percebemos uma melhora e a dor foi, aos poucos, dando um descanso. Rotina de trabalho retomada, momentos sem notar que a coluna existe. Mas foi outra turbulência, nova fase de testes para a tropa, que nos mostrou o quanto as pequeninas haviam trabalhado em silêncio. 
   Agora, nessa nova viagem cheia de incertezas e contratempos, os exames comprovaram que houve significativa regeneração no disco que mais incomodava, e que o segundo não degenerou, como seria de se esperar para o quadro. Os médicos ficaram bastante satisfeitos com o resultado, e consideram que a intervenção foi muito bem sucedida. Alegria e gratidão!
  Nós louvamos ao Senhor por esse milagre, operado por meio de profissionais abençoados, que dedicam seu tempo a descobrir formas de amenizar a aflição alheia. Dor física muitas vezes invisível aos olhos dos mais próximos que, por isso mesmo, julgam o desgaste emocional e não atendem ao clamor por paz de espírito ou compreensão. Cada dia me admiro mais da linda missão dos trabalhadores da área da saúde.
   Agradecemos a todos os amigos e familiares que sempre nos apoiaram nessa jornada, seja com orações, com telefonemas, com conversas e alento virtual (porém real), com visitas desinteressadas e conformadas, com a grande ajuda pessoal nos momentos mais dramáticos, e também com os chacoalhões necessários.
   O sorriso largo ao marcar o risco próximo ao 'ningún dolor' no gráfico e a felicidade de ver, nas fotos, ações espontâneas que há pouco seriam improváveis, nos dão a certeza de que tudo de bom, de nem tão legal e de difícil que enfrentamos até hoje serviram, de alguma forma, para que fôssemos dignos de receber essa dádiva. 
   E nós torcemos, de coração, para que essa pesquisa chegue logo ao nosso país e possibilite melhores condições de vida para as inúmeras pessoas que padecem daquela dor silenciosa e crônica. 'Daquela' sim, porque já faz parte do nosso passado, e espero que continue por lá. A comemoração da leveza era, realmente, uma questão de tempo. 
(http://remandocontraacorrenteza.blogspot.com.br/2012/06/questao-de-tempo.html)

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Medalha


Nos pequenos prazeres,
as maiores conquistas
de uma escola invertida.

Testes que muitas vezes
trazem no erro as pistas 
e premiam o sentido da vida.

Se a incerteza diploma 
e ensina a seguir na maré, 
a medalha que condecora
é uma simples amora no pé.






segunda-feira, 12 de maio de 2014

Prece de mãe

        Nenhum presente que eu poderia pedir superaria os que tenho ganhado: nos piores momentos, a oportunidade de verificar que a única coisa da qual eu não me arrependeria era de ter dedicado meus últimos anos a este ofício; essa semana, a bênção de cuidar da casa, cozinhar e colocar meus filhos no carro para um passeio no centro de saúde e no dentista. Ações corriqueiras e trabalhosas, antes já prazerosas, que agora têm ainda o sabor de vitória.
       Os bilhetes e cartões que recebo revelam a ingenuidade da criança que não enxerga os defeitos da mãe. Mas eu não sou aquela figura de poema e folhinha, sou de carne e osso, humana falível nos desafios da vida, e um dia eles perceberão isso. Por isso eu peço a Deus que nunca me deixe esquecer o quanto de erro e destempero meus essas crianças aguentam, para que, no futuro, eu tenha discernimento para entender suas dificuldades de adultos, boa vontade para escutar seus pedidos e sabedoria para ajudá-los não da forma que eu considere acertada, mas sim da maneira que melhor lhes alente o coração.
          Feliz todo dia, porque todo dia é dia de luta das mães, dos pais, e dos filhos também.


quarta-feira, 16 de abril de 2014

A nuvem de cachorros

 O homem grisalho senta-se na frente da moça. Gesticula bastante e esbraveja que o banco roubou todo o seu dinheiro, aquele papel em branco amassado é a prova do crime. A bancária tem a obrigação de devolver sua fortuna.
_Senhor, não há no sistema nenhuma conta em nome de Presivaldo Mintras.
Fúria, fúria, fúria... chuvisco de cuspe e papel jogado na mesa.
_Dona, meu filho foi assassinado pelo meu irmão, um cachorro está atrás de mim e até rasgou a minha camisa, olha só! E o que o banco vai fazer, nada?
Gláucia não encontra estragos na blusa xadrez. Para livrar-se da situação e dar andamento na fila, tem a brilhante solução:
_Seu Presivaldo, vou anotar os dados para averiguar o ocorrido, volte daqui uma semana, por favor.
Sete dias se passam e, para a surpresa de todos, lá está o homem no canto da agência. Cobra a resposta para o roubo de seu tesouro e não aceita as explicações da funcionária. A cada negativa, fica mais nervoso e amaldiçoa:
_Dona, se a senhora não me ajudar a recuperar minha fortuna, o cachorro vai te pegar! Eu não vou embora! Olha a nuvem, olha nuvem aí em cima.
_Tudo bem, seu Presivaldo, eu sei que o senhor tem razão. Mas vamos fazer o seguinte, leve o telefone do banco anotado e, para evitar se deslocar à toa, ligue para saber sobre o andamento do processo.
O homem vai embora satisfeito, e Gláucia acredita ter resolvido o problema de vez. Doce ilusão! Que ideia de jerico, agora começa a perseguição...
Dia após dia, seu Presivaldo azucrina a telefonista, que já passa a ligação diretamente para quem, quem? Gláucia, a funcionária premiada com os casos de comunicação truncada.
Berros insistentes do outro lado da linha, tentativas frustradas de diálogo com a ‘vítima’, novas ameaças de ataques caninos. Gláucia põe o telefone na mesa para atender os outros clientes e, quando o coloca de volta no ouvido, ainda persiste a ladainha. Depois de algumas promessas de ajuda, ele encerra ligação, repetindo o alerta:
_A senhora está vendo essa nuvem preta em cima da sua cabeça? É tudo cachorro, é tudo cachorro! Ele vai cair e vai te comer, cuidado! É tudo cachorro, é tudo cachorro!
Semanas de telefonemas depois, o homem transtornado, suando em bicas, visita a agência e faz sua última declaração:
_Aquele cachorro mordeu a perna do meu filho no poste. Sabe dona, a senhora não resolveu meu problema, então eu vou embora. Mas olha bem pra mim, olha bem... (puxando a camisa). Se a senhora achar algum cachorro usando minha roupa por aí, é porque ele me comeu!   
Gláucia nunca mais teve notícia do pobre senhor, de quem ocasionalmente se lembra ao avistar um cão. Por sorte, jamais encontrou um animalzinho vestindo aquela calça surrada e a camisa quadriculada.  


Simplicidade presumida

    Nanci sempre estufou o peito ao dizer que era pouco vaidosa. Em casa, no trabalho ou nas festas, o visual era praticamente o mesmo. Simples.
   Batom discreto, vez ou outra lápis para olhos ou delineador, raramente aparava as sobrancelhas. Esmalte nas unhas, apenas para eventos de pompa. Xampu de qualquer marca, secador somente para tirar a umidade, nada de penteado especial; aventurava-se no corte sozinha, comprimentos diversos. Sem compromisso com a moda, para os acessórios nunca deu bola. Alternava sem problemas entre magra e gordinha, o guarda-roupa acompanhava a tendência de quem comia muito ou pouco com consciência.
    Incrivelmente determinada a aceitar-se como Deus a criou, a moça desapegada pouco se afetava pela opinião alheia sobre sua aparência. Ela não entendia o compromisso da maioria com a manicure, a pedicure, a escova, o alisamento, a tintura, a maquiagem, a hidratação, a combinação das peças, a preocupação com a roupa do dia. 
   Até que veio o acaso para abalar as estruturas da crítica e desprendida menina, que considerava tudo perda de tempo e fazia piada da busca pela beleza. Levada a cortar os cabelos, por força das circunstâncias acima do peso, vestimenta fora de estilo, impossibilitada de usar os enfeites que queria, no reflexo uma estranha agonia.
   Para Nanci, aquilo era doído. Não adiantava ouvir que o corte ficou lindo, que o vestido lhe caía bem, que o lenço era um charme, que estava bonita, que nem dava para perceber. O cabelo ia crescer, ela tinha que emagrecer, recusava-se a comprar roupas maiores, responder sobre a echarpe tornou-se fatigante. Nada disso ela havia escolhido.     
   Foi aí que ela percebeu o quanto era presunçosa... Que ilusão, considerar-se abnegada, quando tinha no orgulho de controlar o que a satisfazia no espelho, uma grande vaidade.

sábado, 5 de abril de 2014

Uma história em aberto (o lúdico no desafio em família)

     Quando a mamãe chamou a gente no quarto para explicar os motivos de tanto tempo na frente do computador e ao telefone, e das nossas muitas visitas a médicos e laboratórios, eu entendi tudinho. Era como no Star Wars, os carocinhos estavam atacando a tireoide, e o médico ia ter que abrir para ajudar a acabar com todos eles.
     Claro que eu ouvi algumas conversas e fiquei empolgado quando ela confirmou o que tinha, porque sempre coloco uma moedinha para as crianças com câncer no McDonald´s. Aprendi que todo mundo fica doente e cada um vem com um probleminha pra resolver - eu tenho rinite, meu irmão sinusite, o papai dor nas costas, outros têm dificuldade com as perninhas ou não enxergam bem, e isso é o que veio pra ela.
     Festejamos a formatura da alfabetização e o aniversário, curtimos os priminhos, e logo tudo mudou. Vovó ficou um tempão aqui, e minha tia veio no dia da cirurgia, para ajudar a cuidar de mim. Mamãe voltou do hospital, e todo dia eu perguntava se já ia 'fazer' a cicatriz. Quando vi, parecia um risco de canetinha, que não podia tomar sol.
     Contei que a professora pediu para desenhar o que me deixa mais feliz e triste, e eu fiz a mamãe na cama do hospital, pois é ruim quando ela fica mais de um dia longe. Ela não se importou de eu ter esquecido o que fiz para o que me alegra e, com os olhos marejados, deu um sorriso e disse que o trabalho deve ter ficado muito bonito.
    Dois meses depois, a mamãe precisou ir ao hospital para tomar um remedinho especial, chamado iodo radioativo, que serve para a pessoa ficar curada. Ele é como kriptonita, vem num pacote fechadinho e faz mal pra quem não está doente, então ela precisaria se isolar por alguns dias. Seria legal, eu ficaria na pousada com o papai, uma aventura de meninos.
     Cheguei da escola e a mamãe tinha deixado uma surpresa, a Charada Premiada! Eram potes com uma questão e um recadinho para cada dia que ela não estaria conosco; bastava dar um palpite para ver a resposta e receber o prêmio, quase sempre uma guloseima. O papai filmou tudo pra mamãe ver como foi legal, e eu disse que ela é tão criativa, que até quando vai para o hospital, pensa em coisa divertida. Ah, desenhei uma árvore de presente e pedi para o meu pai imprimir.
     Toda manhã ela ligava, a gente conversava um pouquinho e eu falava "Mamãe, eu tô com muita saudade com você!". Era choro na hora da charada, para falar ao telefone, ao chegar da escola, na hora de dormir. Quando eu caí e machuquei, meu pai me pegou no colo, mas eu só chamava a minha mãe... E ela não estava em casa para ver que o médico costurou minha cabeça e ouvir que eu fui valente, nem chorei.
      Por causa do ataque de uma bactéria, a mamãe retornou ao hospital e nós voltamos logo para casa. Assim que ela pôde receber visitas, eu saí da escola e fui para o hospital; era melhor estar com ela numa sala pequena, sem fazer muito barulho, do que ficar no plantão de estudos e no judô, que eu adoro.
     Entrei e achei tudo meio esquisito; mamãe sentou-se ao meu lado e me encolhi no sofá, olhando de rabo de olho. Logo ela segurou minha mão, disse que eu estava parecendo um tatu, pegou o trim e começou a cortar minhas unhas; daí fui chegando perto, porque com aquilo eu estava acostumado. No segundo dia, pedi para deitar na cama com ela, abracei, suspirei de felicidade e, pronto, começou a disputa e tive que revezar com meus irmãos.
     Perguntei se tinham furado o braço para colocar aquela mangueirinha que leva o remédio, e ela disse que quem tem três filhos é especial e não precisa de agulha. Eles usaram a mesma canetinha mágica que eu tenho para medir o açúcar do sangue, e aquele vermelho era uma tinta colorida, para mostrar se estava funcionando. A enfermeira entrou e eu vi que era verdade, a seringa com soro encaixou igual ao Lego!
      Eu apertava o botão da cama que o Batman tinha deixado e comia a janta que o papai comprava lá no quarto mesmo. Era uma delícia saborear o pão com manteiga do lanche da noite, a gelatina, o iogurte e o biscoito que a copeira levava pra mim. Na hora de ir embora, eu ficava triste e chorava, porque a mamãe não podia ficar sozinha...
     Quando fomos almoçar no restaurante ao lado do hospital, o papai falou para eu olhar lá em cima, na passarela de vidro, e contar até cem; as moças da fila cochichavam que aquilo era um absurdo. Logo a mamãe apareceu e acenou, e eu gritei, contente, tão alto que ela conseguiu ouvir. Foram apenas dois minutinhos, mas ela viu que eu usava, para o dia do brinquedo, a luva de médico que ela deu. Ela não entendeu por que aquelas mulheres acenavam, e depois o papai explicou que elas ficaram comovidas.
      No sábado, a mamãe foi para casa com a gente, só que ainda não tinha sarado e não podia fazer muita coisa. Contrariando suas expectativas, o primeiro destino foi o salão de beleza... Também, pudera, eu sabia que o papai não é tão bom cabeleireiro assim! Ela disse que ele cortou seus cabelos numa emergência, para facilitar nos cuidados, e fiquei tranquilo quando ouvi que ia crescer de novo, porque eu acho comprido mais bonito.
      Quando mamãe veio me dar o abraço e o beijo de bom dia, eu não deixei e agarrei a perna do meu pai, espantado. Ela falou que entendia e explicou que o cabelo estava diferente e a faixa no pescoço ficaria por um tempo, mas ela era a mesma. Na visão dela, não era daquela mãe que eu sentia saudade, mas em cerca de trinta minutos eu me aproximei e ganhei um abraço gostoso.
      Durante quinze dias, foi um bombardeio: "Quanto tempo vai demorar para sarar o seu pescoço?; Tem alguém com mão de robô na sua família?; Eu quero que você me ajude, não quero que você fique doente! Por que você não sara?"
        No restaurante, a mamãe deu as razões de usar o cachecol por cima da faixa, e eu concluí que era para as crianças não se assustarem, pensando que ela era a mulher do Frankenstein! Sabe, aquela que tem um corte no pescoço assim... Ela concordou e riu, porque tinha lembrado somente do Pepe Legal e da Penélope Charmosa.
      Engraçado, uma vez eu pedi uma babá, já que meus amigos tinham, e a mamãe disse que não precisava, porque ela ficava comigo. De repente, ela estava em casa, mas era a ajudante quem cuidava de mim. E quando a Maria me acompanhou até a quadra, eu fiz questão de dizer para as pessoas que aquela não era minha mãe; eu vibro quando ela falta, porque tenho muita vergonha.
       Assim que a mamãe contou que teria que fazer uma nova cirurgia, eu caí num choro profundo... Mas quer saber, foram dois dias muito legais, o melhor fim de semana da minha vida! As amigas dela se uniram no auxílio à nossa família e eu me diverti muito, brinquei nas casas dos meus amigos e na área de lazer, fui ao zoológico, ao parquinho e ao shopping. Quem disse que eu queria ir embora quando o papai chegava? Nem a mamãe eu quis visitar!
      Quando ela voltou, fiquei decepcionado, porque achei que já estaria boa. A alegria foi grande quando trocou o curativo e ficou igual ao da outra vez, e vibrei no dia em que não vi mais o micropore, só a cicatriz. 
      Como nossa vida ficou diferente e a mamãe está mais quieta, séria e brava, ela veio esclarecer a situação. Conversamos um pouquinho e eu, sempre esperto, saquei que ela está doida por causa dos remédios, por isso fica achando que é o Hulk.
      Na minha pesquisa diária, fui me certificar com o papai se fazer espada do Star Wars não era perigoso pra mamãe. E fiz uma proposta, já que ela podia mexer com as mãos, eu poderia ajudá-la a preparar os sabres de luz que eu tanto queria. Foi um domingo muito legal.
        Nós guardamos os planos para quando ela estiver boa de vez, sou bastante criativo e há muito o que não conseguimos fazer juntos. A rotina está se ajeitando lentamente, e a cada coisa que ela faz por mim, eu corro radiante e grito para os meus irmãos que a mamãe está melhorando. Ainda é um pouco difícil e tenho que tirar muitas dúvidas da minha cabecinha, por isso hoje perguntei assustado se a pediatra tinha achado algum caroço em mim. A mamãe garantiu que isso não aparece em crianças, só em mulher mais velha, e eu sorri aliviado, não preciso me preocupar com isso.
     


*Texto baseado nos comentários de três pimpolhos valentes e nas respostas para amenizar a realidade imprevista. Com criança o desafio é grande, mas o bálsamo da diversão é garantido.



sexta-feira, 14 de março de 2014

Atividade de casa

Atividade de casa para o primeiro ano - "Você gosta de alguma poesia? Se sim, traga-a para ler com a turma na sexta-feira."
Papai lê a agenda na segunda-feira: 
P: Filho, você gosta de alguma poesia?
C: Não, pai.
P: OK. Então não precisa levar nada na sexta.

Mamãe lê a agenda: 
M: Filho, hoje é sexta, vamos escolher a poesia para você levar.
C: Eu não gosto de nenhuma poesia, não preciso levar.
M: Mas você sabe o que é poesia?
C: Não, mas eu não gosto. 
M: Sabia que tem poesia que vira música, que primeiro se escrevem os versos e depois juntam o som? Você não gosta de saber as letras? Então, vamos escolher uma poesia assim.
C: Então tá. Eu quero uma do One Direction.
M: Não, filho, tem que ser em português. (...insistência...) Porque você está no Brasil, numa escola brasileira, não é hora de ler poesia em inglês.
C: Já que é assim, quero uma do Charlie Brown Jr.

Mamãe respira fundo, vai pro computador e mostra uma imagem do livro 'A Arca de Noé'. O mais velho diz que já leu, e ela explica que cantores que gostavam muito do Vinícius decidiram transformar aquelas poesias em música.
M: Alguém tem dois CDs 'A Arca de Noé'? Gosta das músicas? Qual das letras você gostaria de ler?
C: Nós temos, mãe! Eu gosto muito! Quero a do pinguim.

Mamãe acha a letra da música, coloca o vídeo do youtube e o menino lê cantarolando, enquanto o caçula empurra e grita que também quer ver. Ela imprime o poema, e aquele que não precisava fazer a tarefa de casa vai pra escola feliz, porque sabe de cor uma poesia de Vinícius de Moraes.
O pai? Quando ouve a odisseia da mãe quase surtada, ainda tem a coragem de cair na risada e dizer que isso tem que ser registrado.
Realmente, homens são de Marte, e mulheres são de Vênus. Desse jeito, as muié pira!

segunda-feira, 10 de março de 2014

A uma categoria de mulheres, o esquisito 8 de março


    Senta aqui, Maria, precisamos conversar. Percebo que você, apesar de minha insistência, rejeita os sessenta minutos para almoçar e descansar. Como era no outro emprego? Ah, eu podia imaginar: não tinha controle de jornada, não recebia adicional noturno, comia rapidinho e corria para adiantar o serviço. Você não admite um momento de pausa no âmbito do meu lar e fica acanhada com minha oferta de sentar no sofá para ver TV ou ler uma revista nesse período. Já está acostumada com a lida, sempre foi assim, não precisa relaxar um pouco na área de lazer do condomínio. Compreendo o que te incomoda, Maria - sei que essas alternativas são muito diferentes de trabalhar em uma loja e passear pelo centro da cidade na horinha de folga.
     Acontece, Maria, que as coisas mudaram, e as domésticas agora têm reconhecidos os direitos essenciais de qualquer trabalhador. Um deles é o intervalo no meio da jornada, do qual você não pode ser privada. Nem adianta querer negociar, dizendo que vai trabalhar por oito horas ininterruptas, tendo chegado aqui depois de duas horas na estrada, para tentar sair mais cedo e pegar o longo caminho de volta com apenas o macarrão instantâneo no estômago. Podendo poupar o que gastaria com a senhora que dela cuida, dinheiro que te faz falta, você decidiu não trazer sua pequena justamente porque sabe o quanto essa rotina é sacrificante, não é mesmo?
    Reconheça: como todos os outros que têm horário de almoço, você é gente, Maria, e a gente não consegue viver bem sem uma pausa durante o dia. Sei que você é sofrida, vive para trabalhar e está comigo por falta de opção. Veja-se não apenas como uma empregada, e sim como uma mulher jovem, bonita, que tem um corpo para alimentar, saúde para resguardar, além de uma mente para relaxar. Pois ao contrário do que divulgam, é preciso usar o cérebro na dura rotina de fazer uma casa funcionar. 
     Você sabe que nunca tive empregada e não fico confortável com diaristas, por vários motivos, certos ou errados, dos quais não consigo me desvencilhar. Sou controladora ao extremo, gosto de fazer tudo sozinha, detesto repetir orientações, acho que os papéis se misturam e que é inconcebível alguém ter a obrigação de guardar os calçados e limpar a sujeira negligenciada de pessoas saudáveis. Mas agora, Maria, eu não posso me esforçar. Você foi contratada para me substituir nas minhas limitações, eu não te cobrarei o que nunca conseguiria fazer em condições normais. Se te confio meus maiores tesouros, os filhos, sei que o resto não ficará impecável, pois só exige isso de uma única pessoa quem nunca cuidou sozinha de crianças em casa, e talvez nem teria ideia de por onde começar. 
    O mesmo desconforto que você tem ao usufruir seu horário de almoço, Maria, eu sinto ao vê-la se matando de trabalhar em minha casa sem descanso; me faz mal ter a casa mais organizada que o habitual, a esse custo. Eu conheço a dureza, o cansaço, a dor no corpo e o estresse de não ver o trabalho acabado, além da falta de reconhecimento pelo restante da comunidade. Tantas mulheres acreditam que esse serviço não lhes merece e recusam-se a ensiná-lo para a nova geração de meninas descoladas e independentes, que me pergunto: quem pagará por tamanha comodidade, quando você e suas amigas finalmente internalizarem o imenso valor desse trabalho?
    Embora eu não considere esse tipo de relação trabalhista agradável, garanto que a nossa será totalmente legal. Você caiu num lar de advogados e não aceito burlar essa lei, que considero tão justa e cujo real significado você em breve irá compreender. Creio que uma prática vale mais que mil bravatas, e que o ideal defendido tem que começar a ser aplicado na menor célula da sociedade sob meu controle, que é a minha casa. Se alguém te fez acreditar que é favor te dar um emprego e adequar seus direitos à planilha familiar de supérfluos e viagens, pasme, você foi vítima de exploração e conveniência travestidas de bondade. Então mesmo que isso pudesse me beneficiar de algum modo, recuso-me a abusar de sua ingenuidade e não abrirei mão do seu intervalo para alimentação e repouso. É seu direito, é lei, é meu dever.
     Com tudo explicado, Maria, eu entendo seu lado e não desejo te constranger. Se você declina uma hora de almoço, temos a opção da jornada de seis horas diárias, cinco vezes por semana, com o descanso de quinze minutos. Já te mostrei as diferenças, que eu vivenciei nos tempos de bancária. Repare nas contas, nesse sistema teremos que fazer alguns ajustes e sua hora sairá mais cara, mas não considero justo te pagar menos do que o emprego anterior te dava por quarenta e quatro semanais. Fico feliz que você tenha pensado e escolhido as trinta horas que considera melhor, mas confesso que sofro, Maria, por achar que ainda não a remunero pelo que você merece. Porque se eu fosse cobrar pelo valor que dou ao meu serviço, que temporariamente te delego, poucos teriam condições e vontade de pagar.
     Depois dessas semanas de profundas experiências, dedico a você, Maria, e às tantas outras que, na falta do cubículo 'exclusivo', sentam no chão da sala e cobram, por uma noite como babá, menos que a metade da conta do chope do patrão, o esquisito 8 de março. Porque uma premissa de araque do louvável e necessário feminismo não me explica o motivo de uma categoria de mulheres, a sua, poder ficar relegada aos abominados encargos com a casa e a cria. Cuidados com o lar e os filhos alheios, em detrimento dos seus, é claro, para que mulheres mais favorecidas consigam arregaçar as mangas e lutar pela nobre causa.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Alfabetização e sensibilidade


Um depoimento de satisfação (27 de fevereiro de 2014)


FOTO 1: Aos 5 anos, numa escola que falava de Deus, tinha acolhida, e dizia usar várias teorias, sem antecipar o processo de alfabetização. A professora fazia correção desde as primeiras letras cursivas (G,H,J), dizia que a caixa alta morreu e exigia letra redondinha em todas as atividades. Terrorismo total, com ameaças de vários tipos para quem insistisse com a letra de forma. A última palavra que ele escreveu no Jardim II, em agosto, foi 'helicóptero'. Resultado: um menino precoce, que aprendeu a ler e a escrever sozinho aos 4 anos, andava tenso, desmotivado, não queria mais desenhar, folhear livros e gibis, passou a dar mais trabalho para se alimentar.

 O QUE OS PAIS DOIDOS FIZERAM: tiraram o menino da escola, e não colocaram em outra. A mãe, que teve mais trabalho em casa, mostrou que a letra de forma não morreu e é usada em muitas ocasiões. Fez um certificado parabenizando-o por já ter alcançado o esperado para a idade dele, além de uma carta dos anjos escolares, que e stavam lhe presenteando com as "super férias". O menino usufruiu a companhia dos irmãos o dia todo e não fez qualquer atividade com letra cursiva nesse período.


FOTO 2: Aos 6 anos, numa escola que não trata de religião, é tradicional, usa cartilha, tem fama de exigente e não prega teorias alternativas. Resultado: depois de apenas um mês de aula no primeiro ano, tem um aluno empolgado, com letra caprichada, que desenvolveu sua própria técnica para treinar antes de responder a tarefa, tamanha a satisfação. Nem parece que ficou meio ano sem estudar. Correção em livro e caderno? Nenhuma, a exemplo do que ocorreu com o irmão mais velho no ano passado. Ah, e o irmão, no segundo ano, ainda pode escrever com letra de forma.


À época do Jardim II, quando questionamos a primeira escola, ouvimos: "AH, MAS O MUNDO DE HOJE É ASSIM." Nossa resposta: "Pois então, fique com ele, não serve para nós. Não há teoria que nos convença de que uma criança tem que viver como um adulto mirim e seja obrigada a antecipar etapas em sua vida."
O tempo mostra.

Justiça com as próprias mãos e barbárie

26 de fevereiro de 2014

É isso que acontece. Imagino o sofrimento desse ator, que por sorte não foi pego por populares justiceiros e correu o risco de perder a vida em nome da 'ordem'.
Dia desses, aqui no DF, um adolescente saiu do vestibular e resolveu aproveitar o carnaval de rua. Foi confundido com um ladrão, e covardemente espancado por aqueles que se julgam superiores, a serviço do bem e da justiça. Aluno aplicado, filho exemplar, foi parar no hospital. Um amigo, que também apanhou, não conseguiu defendê-lo.
Pode até ser bonito e mais prático ver o resultado imediato da justiça com as próprias mãos nos desenhos do Batman, nos filmes de herói e na reportagem da TV, no discurso de uma jornalista que confunde vingança com legítima defesa.
Mas é bom lembrar que, instalada a barbárie, com julgamento sem lei, qualquer um pode ser confundido com um bandido, torturado e morto pelos heróis da comunidade: eu, meus filhos, parentes, amigos, você.

Reportagem: http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2014/02/26/interna_brasil,414797/ator-preso-por-engano-no-rio-de-janeiro-deve-ser-solto-nesta-quarta.shtml

Um vídeo emocionante

24 de fevereiro de 2014


Diz o ditado que ninguém cruza seu caminho por acaso.
Há algum tempo, quando tive notícia dos desafios que um amigo de faculdade enfrentava, fiquei muito tocada... Apesar de não sermos tão próximos e não nos vermos há uma década, de certo modo me identifiquei com o que ele estava passando. Nessa época, eu sequer lembrava que tinha tireoide, tudo andava normal por aqui. Trocamos mensagens, e eu venho acompanhando sua luta via facebook.
O tempo passou, as surpresas vieram, e eu recebi de um tio esse depoimento do Celso Fernandes Jr., um oncologista que descobriu ter câncer. Ele é idealizador do Centro de Apoio ao Paciente com Câncer de Londrina. 
O vídeo me tocou bastante e, talvez pela profundidade do assunto e pelas semelhanças com a realidade que me veio, só o compartilhei via mensagem, com quem passava por problemas parecidos.
Hoje de manhã, depois de um domingo difícil, me deu vontade de dividir o vídeo com esse amigo. Mandei a mensagem, segui para o feed de notícias, e logo vi uma postagem dele, sobre a 'bactéria - muitas vezes a única cultura que um indivíduo possui'. E não é que essa piadinha infame salvou meu dia? Por causa dela, tenho dado boas risadas e me sentido menos esquisita ao olhar no espelho.
E agora tenho coragem de compartilhar esse vídeo com vocês. Não é curtinho, mas vale muito a pena assistir.
Rodrigo Martiniano Tardeli, obrigada por alegrar meu dia. Sua garra é um exemplo para os tantos que te admiram.

O depoimento: http://www.youtube.com/watch?v=98tdXEZ510M

Privações

23 de fevereiro de 2014

   Nessa temporada de sucessivas privações, sempre me vem em mente que sou abençoada, porque são temporárias, ao passo que, para muitos, elas são permanentes, sem nada que as alivie. Tanta coisa na cabeça, ideias pra colocar no papel, aos poucos vou escrever sobre as experiências.
   Esses últimos dez dias no hospital, em especial, me marcaram bastante, acho que pela privação da liberdade, do contato com o resto do mundo, da sensação de impotência e de estar, literalmente, nas mãos do outros...
Pensei muito nos pacientes que ficam meses, anos nessa condição... Mas pensei demais, e não paro de pensar, naqueles que ficam reclusos em delegacias, presídios e unidades de internação para menores infratores, em celas superlotadas, na sujeira, impossibilitados de se movimentar ou fazer as necessidades básicas com dignidade, relegados ao ócio, sem a chance de produzir qualquer coisa, de aprender algo que lhes desperte a noção do próprio valor e do valor do próximo, submetidos aos horrores que sabemos acontecer nesses lugares.
   Eu estava muito bem assistida, sozinha num quarto arejado, com TV, telefone, internet, cama, sofá, poltrona, comida farta, podia andar pelos corredores, falar com a equipe de enfermagem, via meu marido diariamente, depois passei a receber visitas... E digo, foi horrível, difícil não surtar, na tentativa de sair de lá com a cabeça pelo menos do mesmo jeito que eu entrei, porque, apesar de todas as comodidades, me sentia presa, algum direito essencial do ser humano me faltava.
   E eu não consigo enxergar como nossa realidade prisional pode, de algum modo, recuperar quem quer que seja e devolver para a sociedade alguém melhor do que entrou. Nosso sistema é indigno, é desumano, é cruel. Pena de morte seria presente e libertação para quem está numa situação dessa. Se algum indivíduo se recupera, deve ser pela própria luz, toque divino, sei lá, algo que o despertou e que o faz nunca mais querer voltar para o inferno.
Nada minimiza a torpeza dos crimes cometidos, a dor irreparável das vítimas e seus familiares, criminosos devem pagar por seus erros e a reclusão é essencial em muitos casos. Mas reclusão para tratar gente como animal, sinceramente, não ajuda ninguém. E quem acha que direitos humanos é frescura ou apenas para pessoas 'de bem', coisa de quem defende bandido, deveria pensar um pouquinho fora da caixa e rever seus conceitos.
   Porque no Brasil não temos pena de morte (que não apoio), tampouco prisão perpétua. Sendo assim, diante da realidade de que, mais dia menos dia, esse ser humano (quer queiram ou não, bandido é gente), vai voltar para a comunidade, atravessar a mesma rua que você, estar no mesmo ambiente que seu filho, talvez se apaixonar por um parente seu, qualquer cidadão 'de bem' deveria, mesmo que apenas pelo instinto egoísta de sobrevivência e preservação da própria família, apoiar e cobrar políticas públicas que garantam o cumprimento dos direitos humanos a todas as pessoas. E isso inclui um sistema prisional que trate com dignidade aqueles que você, assim como eu (confesso que é a primeira sensação em muitos casos, depois repenso), acredita merecerem o velho e irracional 'olho por olho, dente por dente'. 
   Vamos lutar pela civilidade e humanidade, minha gente, a evolução foi lenta para chegarmos onde estamos. Até passarinho em gaiola, bicho em jaula e elefante num circo nos causa piedade, não é? Quem acredita no ser humano e na ressocialização não pode ser contra direitos humanos.

   

Reconhecimento

21 de fevereiro de 2014

         Benditos sejam os profissionais da saúde, em especial aqueles que lidam diretamente com os pacientes e suas famílias, muitas vezes ultrapassando os limites do corpo (quando dormem?), esquecendo as próprias dificuldades e lutando contra descaso, falta de estrutura e precariedades. A todos os seres humanos, dos menos aos mais graduados, que cumprem seu ofício e fazem uma clínica, um posto ou um hospital funcionar, sem os super poderes que tantos erroneamente lhes atribuem e cobram, minha grande admiração.

Pequeno registro

13 de fevereiro de 2014

Home alone - quando um apartamento de 87 m2 vira uma mansão e o silêncio não é ouro.— se sentindo perdida.

Radioactive

11 de fevereiro de 2014

"Se a vida te der um limão, faça uma limonada." 
Bora ficar um pouquinho perigosa, (mais) azeda e enjoada! 
Tempinho de isolamento e cárcere privado, para a segurança dos queridos; mas se algum desafeto quiser tirar onda e fazer graça, pode vir que eu abraço à vontade, hehe!
Pelos próximos nove dias, tamo aí na radioatividade. 


Radioactive (Imagine Dragons):
http://www.youtube.com/watch?v=W6HXRUlTIXI



segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Rupturas

Que verdade querem calar, ensaiando rabiscos que o vento vai apagar?
Do que necessitam se poupar, esmorecendo quem chora lentamente?
Qual ferida desejam curar, sem um esforço para enxergar o doente?
Que ajuda acreditam dar, quando a forte súplica nunca é suficiente?
Que festas teimam em estragar, vendo que são restos a comemorar?

Que casa insistem em limpar, enquanto a luta é para não desmoronar?
Que caprichos anseiam mimar, num momento em que nada é o presente?
Que assuntos martelam sem parar, quando a maior preocupação é patente?
Que piadas e lamúrias fariam rir ou chorar, já que o fardo é em si exigente?
O quanto é preciso gritar, até que vejam a fra(n)queza num singelo olhar?

Se a experiência já ensinou muito, o que ainda falta para captar?
Se o importante está arquivado, por que na lembrança emperrar?
Se confidente não é, terapeuta jamais, que conselhos vai desperdiçar?
Se o papel na novela deveria ser outro, que peso vale a pena suportar?
Se assume as rédeas e os riscos, que grupo os outros têm para chefiar?
Semelhanças há, mas se a ocasião é única, que vantagem em analisar?

O todo não é mais inteiro, a lacuna é agora um escudo de paz.
Para velhas questões sem resposta, o silêncio replicou demais.
Vez que os muros sequer se abalam, o consolo está desenhado.
Registre-se o impreterível hiato; lixo emocional alheio, dispensado.
A fase do jogo é nova, reorganização da alma num avariado aparelho
compreendido por quem está ao lado, e pelo denso reflexo no espelho.

domingo, 26 de janeiro de 2014

Primeira etapa da missão: cumprida

         Eis que se aproxima o primeiro dia do caçulinha na escola, e termina a fase mais importante da minha vida. Como uma mãe perdida, totalmente pega de surpresa pelas peças que o destino prega, faço aqui um desabafo.
Em tempos de feminismo extremado e materialismo exagerado, o fato de uma mulher deixar um bom emprego para se dedicar integralmente aos cuidados com os filhos é praticamente visto como um sacrilégio. Leio tanta baboseira e ouço cada pérola... dentre elas, as marcantes: 'Você ainda vai se arrepender disso!', 'Unespiana? Ah, que desperdício!', 'Tanta gente se matando para passar num concurso, e você faz essa loucura?!'
           Eu penso diferente - a boa colocação que para os muitos é vista como um fim, para mim foi só um meio. Anos de dedicação aos estudos e ao inglês me levaram ao magistério e também à Unesp, que colaborou para que eu chegasse ao serviço público. Isso, aliado a muito planejamento e priorizações, possibilitou a concretização de um propósito que eu nutria desde adolescente: o de dar uma pausa, caso tivesse filhos, para cuidar deles até que chegassem na idade em que já conseguissem se expressar adequadamente e estivessem preparados para entrar na escola; queria passar para eles o que eu tive: uma mãe presente o tempo todo. Ou seja, foi por causa de tudo o que eu já havia conquistado quando entrei no mundo da maternidade, que eu tive a oportunidade de escolher.
E eu optei (esbravejem os teóricos ou esperneiem os questionadores de plantão contra essa definição) por ser mãe em tempo integral - aquela que fica à disposição de suas crianças 24 horas por dia, atendendo a todos os seus chamados (que ocorrem a cada meio minuto), sem qualquer substituto ou intermediário nesse encargo. Encargo quase enlouquecedor, sejamos francos, mas extremamente gratificante e maravilhosamente recompensado, que não fez de mim uma mãe isenta de falhas e culpas, melhor ou pior que qualquer outra. Esse é tão somente um compromisso que eu assumi comigo mesma, uma parte da minha trajetória, e é apenas sobre ela que posso falar.
         A propósito, o melhor que a Unesp me trouxe foi o amor da minha vida, que nunca interferiu ou questionou, e sempre respeitou minha decisão, reconhecendo o valor do meu trabalho doméstico.
Na verdade, essa fase acabou um pouco antes do que eu havia imaginado... vai ver que é a intervenção divina, atropelando todos os meus planos e dando um empurrão para que eu libere o 'menino grande' de três anos, que veste roupas e tem atitudes de um moleque de seis, e enfim tenha um tempo para cuidar de mim. Como eu nasci com pouca vaidade e sonhos minguados, é óbvio que esses cuidados imediatos e inadiáveis não serão realizados no salão de cabeleireiro, na manicure ou na academia, e os longos nove dias que passarei distante dos meus pequenos em nada se parecerão com férias relaxantes num spa ou resort. Entretanto, arrisco dizer, será um período intenso de renovação e revigoramento, que me preparará para investir na segunda parte daquele meu projeto, que é voltar para o mercado de trabalho no período em que os meninos ficam na escola.
Assim como eu previa, depois desses sete anos e cinco meses ininterruptos por conta da cria, os concursos, a advocacia, as escolas de inglês e as vagas na iniciativa privada continuam aí, disponíveis. Alguém me substitui e exerce seu papel no cargo que eu abandonei, e é claro que eu não devo ter feito muita falta. Mas os primeiros anos dos meus filhos, aqueles em que somente eu poderia ter agido como a mãe deles faria, passaram voando e não voltam nunca mais. E qualquer insensatez, submissão, machismo ou um mínimo arrependimento, continua somente na cabeça dos outros.
Enfim, primeira etapa da missão cumprida... E que venham os novos desafios.

(25 de janeiro de 2014)

Escrevo porque preciso

Escrever é uma necessidade...  O pensamento chega, o texto se ajusta de forma meteórica e necessita ser externado. Um process...