sexta-feira, 9 de agosto de 2013

“Quando você tiver minha idade, a gente conversa.” A saga do diálogo impossível.

 “Quando você tiver minha idade, a gente conversa.” Resposta inútil que não aproxima, só evidencia a distância; tática injusta para encerrar um debate. Você já teve nove anos, eu demorarei muito para completar os seus atuais quarenta, e parece-me que nunca terei condições de te alcançar. Mas se é a vivência que conta, diga-me, é verdade que meus poucos anos importam tamanha falta de atenção? Prefiro acreditar que eu, na pequenez de meus cento e vinte centímetros, conto com requisitos suficientes para merecer uma saída melhor para minhas dúvidas.
Ative sua cápsula do tempo imaginária. Volte à sua infância, lembre-se de como era nessa época – suas dúvidas, seus anseios, suas necessidades; procure indícios de que, na mesma idade, teria como rebater esse argumento. Por acaso você, que hoje está no alto de um metro e setenta, passou pelos procedimentos médicos aos quais já fui submetido? Sofreu de intolerância alimentar? Nasceu da mesma barriga, foi criado no mesmo ambiente, também viveu distante de todos os parentes, mudou de escola mais de uma vez? Seus pais tiveram contratempos semelhantes aos que você me apresenta?
Lá no futuro, observe seus lábios no espelho e repita, vagarosamente, aqueles mantras de décadas passadas que você já terá abandonado, seja pela mudança de pensamento ou pela verificação de sua impraticabilidade. Será capaz de contar quantos deles você terá incutido na minha mente, influenciando, de forma inevitável, minhas escolhas? Ah, mas nem poderei me atrever a comentar, pois você será sempre o mais experiente e eu, claro, só o entenderei quando tiver a sua idade.
Viagem encerrada, não vê nada para aprender comigo? Interessaria fazer-se de carne e osso, dividir suas incertezas de outrora, mostrar-me que aprendeu com os tropeços da vida e que nada era tão fácil assim? Por que não ajustar sua idade e esperteza ao que a minha maturidade permite compreender?  Doeria muito explicar os motivos de sua decisão e, diante de meu inconformismo natural, salientar que eu, quando crescer, provavelmente pensarei diferente e tomarei meu próprio caminho?
Por favor, perceba que meus questionamentos são presentes, que não quero resultados prontos do passado, tampouco réplicas para o futuro. Dialogue, reflita, reconsidere, dê uma justificativa que valha. Seria tão bonito descobrir que seu heroísmo dispensa máscaras ou capas, e que você sempre procurará me socorrer nas confusões que minha cabecinha curiosa e incessante insiste em armar! 
Responda logo, não tenha receio de se rebaixar ao meu estágio... Desista de usar essa fórmula fraca como trunfo, achando que está na vantagem porque é mais velho. Isso não é uma questão de sorte; a matemática comprova e a lógica diz que sempre haverá entre nós os trinta e um anos de diferença. E já que tempo é implacável com todos, faça um esforço para conversar agora... Se eu não perecer primeiro e um dia conseguir identificar, mirando as datas na lápide, que finalmente cheguei à sua idade, possivelmente as lágrimas substituirão aquilo que não poderá mais ser falado.

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