É engraçado
como uma criança inocente aparenta ter mais noção de alguns direitos que muitos
adultos letrados, e inesperadamente nos coloca diante de uma
situação que põe à prova nossas próprias convicções.
Meu filho de
apenas quatro anos anda avesso a fotografias há tempos: reclama de porta-retratos, faz de tudo para se esconder das câmeras, afirma não querer
lembrança nenhuma. Essa semana, solicitou de forma incisiva que eu retirasse todas as fotos
dele da internet. Na hora, me veio o questionamento: seria coisa de criança,
tentativa de chamar atenção digna de ser ignorada, ou deveria eu dar-lhe
ouvidos e excluir suas fotos da minha página no facebook? Optei pela segunda
opção, e ele acompanhou feliz o procedimento. Por quê?
Porque essa pessoinha,
não sei como, já percebeu que uma imagem se relaciona com a personalidade do
retratado, que é seu direito não querê-la exposta para os olhares públicos e que ele não precisa explicar a razão de sentir-se mal com a divulgação. E
eu, sabendo que isso é verdadeiro, não estaria correta ao abusar da minha posição de mãe e deixar de dar
o exemplo que espero dos outros.
Fico realmente
intrigada diante de manifestações ridicularizando famosos que tiveram fotos
íntimas publicadas na rede sem autorização. Justifica-se tudo na qualidade de
pessoa pública dos artistas, chamam-nos de estúpidos por terem guardado as imagens em seus celulares, computadores ou câmeras, invadidos maliciosamente por terceiros. O que será que essas pessoas que criticam as vítimas responderiam à pergunta: e se fosse com você? Quem acessa essas fotos e as divulga de forma vil e dolosa mereceria aplausos por fazer internautas felizes ao
visualizá-las ou prêmio pela esperteza? Claro que inúmeras delas responderiam não se importar com isso e que os hackers prestam um belo serviço à comunidade cibernética. Entretanto, a condescendência de alguns não tira do ofendido a prerrogativa de exigir a punição dos culpados, pois mesmo a 'estrela' que tem diversas imagens estampadas por aí (com sua permissão, diga-se de passagem) continua com o direito de decidir que certos retratos não são passíveis de publicação.
Voltando ao
site de relacionamento, penso que a modernidade virtual tem deixado muitas
pessoas abestadas e alienadas, fazendo-as ignorar propositadamente muitos princípios e direitos
básicos de qualquer cidadão. Tudo é permitido e qualquer excesso é bonito quando
necessário para satisfazer o ego, faz-se ouvidos moucos a apelos
legítimos e taxa-se de antissocial ou encrenqueiro aquele que procura zelar por sua
privacidade.
Minha
filosofia é a seguinte: 1) Cada um divulga em primeira mão o evento que
promoveu e quem quiser postar fotos
da festa de aniversário, formatura ou casamento, deve fazer a gentileza de
perguntar antes. 2) Quando um parente não é seu amigo na rede social devido a um mau relacionamento, é necessário ligar o desconfiômetro e não divulgar imagens dele no seu perfil. 3) Se um amigo avisou que não gosta de ver sua cara na web,
é prudente fazer uso de semancol e contentar-se em publicar fotos das dezenas
de pessoas que não se incomodam com isso. 4) É imprescindível o bom senso de não divulgar
sem prévio consentimento fotos ou vídeos recebidos por e-mail ou mensagem
fechada, pois se o dono da arte quisesse tal exposição, possivelmente o teria feito de
antemão. 5) No caso de reprimenda por postagem inocente de imagem alheia, prova-se
a alegada boa intenção ao remover a foto imediatamente e sem estardalhaço, e um
pedido de desculpas cairia bem. 6) Fotos de outros em trajes íntimos ou de banho? Indispensável a anuência expressa do dono do corpinho.
Podem
falar que eu concordo: sou mesmo complicada e um tanto conservadora, e vê-se que o pequeno ‘do contra’
certamente tem a quem puxar. Acontece que os chatos e esquisitos também têm
direitos previstos constitucionalmente, e insistir em contrariá-los é no mínimo indelicado. Acreditem se quiser, mas eu tenho o cuidado de perguntar ao meu marido se posso publicar fotos dele, e acato as respostas negativas.
Obviamente, meu intuito sempre foi mostrar aos amigos momentos
felizes com os pimpolhos, mas quando alguém não deseja divulgar sua foto, pouco
importa o senso comum e nenhuma diferença faz a motivação de quem a publica: deve
prevalecer a vontade do ‘modelo’. Portanto, de agora em diante divulgarei apenas as do mais velho, que já disse gostar de se ver no computador, e do caçula, que ainda não entende dessas coisas. Acredito que, acatando o pedido do ‘custoso-mirim’ para retirar suas imagens, demonstro consideração pela sua individualidade, e essa simples atitude é capaz de gerar respeito e confiança mútuos, elementos indispensáveis numa relação familiar. Pode ser que num futuro próximo ele mude de opinião e me autorize a publicá-las novamente, e não nego que terei o maior prazer em fazê-lo.
Cá entre
nós, que diferença me faz não poder postar essas fotos no facebook se eu posso
olhar diariamente milhares delas em meus arquivos, ou melhor, se eu tenho o filhote ao meu alcance para uma conversa legal, um abraço e um cheiro gostoso? Priorizar o que se mostra para o mundo pra quê?
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